Começo a escrever essa newsletter de um café muito charmoso de Paris. A carta de hoje será intima e provavelmente diferente do que você espera - você foi avisado.
Ontem, divulguei uma carta explicando em detalhes o que era o Metaverso. Na verdade, como eu comentei, eu vim parar em Paris justamente para participar de diferentes eventos sobre blockchain, tecnologia, metaverso, DeFi e Refi que estão rolando pela cidade nessa semana.
Estou aprendendo muito nos eventos que estou participando e isso me anima: a aprender mais, a conhecer mais, a me expandir mais. A verdade é que são poucas pessoas (principalmente mulheres) que tem acesso a esse tipo de conhecimento, a pessoas que estão trabalhando com isso e vem a de fato trabalhar nessa área.
E isso é uma das grandes motivações de também escrever cartas mais “técnicas” explicando mais desse mundo. É importante que mais pessoas saibam disso - especialmente nós mulheres.
Mas, preciso confessar algo.
Na carta de hoje eu desejo abrir meu coração e dividir minhas fragilidades.
Acredito que demonstrar a nossa totalidade não é mostra de fraqueza, e sim mostra de humanidade. Em um mundo tão cruel, fechado, ainda é um ato de coragem retirar os possíveis véus existente entre mim e quem quer que esteja lendo essa carta.
Ainda é um ato de bravura me permitir ser quem eu sou… e não quem eu gostaria de ser.
Sabe, Paris é uma cidade linda. Em alguns momentos, ao caminhar pelo Sena e ver a torre Eiffel eu não pude evitar em pensar em como era possível ver tanta beleza junta. Os prédios, o por do sol, o rio, tudo. É um privilégio viver a vida que eu vivo, ver tantos países e poder realizar sonhos. É inacreditável eu ter minha mentoria, ter uma rede de networking excepcional, poder estar em Paris para aprender sobre créditos de carbono, metaverso e blockchain e ainda poder escrever sobre isso e muito mais.
Mas, tudo isso tem sido um convite para olhar para dentro e realmente pensar quem eu sou e meu lugar no mundo. Quanto mais eu viajo, quanto mais eu conheço lugares e vivo experiências diferentes, mais eu entendo o meu lado frágil.
Eu tento acolher esse lado e realmente entender que eu não preciso ser perfeita.
Eu só preciso ser eu.
Pode parecer paradoxal para outras pessoas que me conhecem pelas redes sociais e que acreditam que eu sou uma pessoa extremamente social eu resolver falar sobre fragilidade durante uma semana repleta de eventos e possibilidades de networking. Na verdade, essa seria a oportunidade perfeita para capitalizar em cima disso. Escrever sobre, fazer milhares de stories e em todas as redes sociais possíveis, me posicionar como uma expert no assunto… e claro, impressionar a todos, não só online, mas aqui presencialmente também.
Mas, a verdade é que quanto mais eu me exponho a esse tipo de eventos e situações, mais eu entendo uma parte minha que eu ainda tenho dificuldade de aceitar. Por muitos anos eu acreditei que eu amava cidade grande, a ideia de trabalhar de salto alto em um escritório e comandar uma legião de empregados vivendo aquela vida de girl-boss-bitch. Eu tinha certeza que esse era meu futuro. E bom, eu fui atrás dele! Eu fiz dois mestrados internacionais - completos ainda com 25 anos - e fui trabalhar como consultora estratégica pro governo de Dubai em um dos programas mais competitivos do mundo. Morava (literalmente) em um hotel 5 estrelas em Dubai pago pelo minha empresa, aprendia com os melhores líderes e desenvolvia projetos que eu nem sabia que existia.
Mas, isso tudo não foi suficiente.
Me dei de frente com uma realidade difícil de ser aceita: eu queria mais.
Minha mentora me falou uma vez uma frase que eu nunca esqueci, e que eu sempre divido na minha própria mentoria: “Qualquer coisa além da nossa visão autêntica de sucesso nunca será o suficiente."
O que eu queria não se encaixava em nenhuma caixa conhecida por mim. Eu queria empreender, queria viajar, queria ler livros, queria escrever de cafeterias pelo mundo. Queria me inserir no mundo, mas com espaço suficiente para mim mesma, na minha versão mais autêntica. Quem que faz isso? Meus sonhos me pediam por uma vida que ao olhar ao meu redor ninguém tinha. Eu não tinha exemplos, não tinha inspirações, e eu realmente não sabia o que fazer.
Isso me levou a tempos difíceis.
Existe um momento que se você não faz algo por você, você chega num limite. E meu limite chegou em janeiro de 2021. Vou poupar vocês de uma história que envolve traições, términos e muitas feridas emocionais. Afinal, eu dei a volta por cima. Eu lancei meu projeto, eu viajei, eu comecei a escrever e tomei muitos cafés no caminho.
Ao trilhar essa jornada, quase que acidentalmente me dei de frente com esse mundo de tecnologia, blockchain, e agora sustentabilidade juntando tudo isso. Entender como essas ferramentas estão mudando o mundo e estão construindo novos paradigmas me anima. Modéstia a parte, eu sou extremamente boa em captar tendências no começo, principalmente ligadas ao futuro do trabalho, futuro das relações humanas e futuro da sociedade de maneira geral.
Para mim é óbvio que todas essas coisas (metaverso, blockchain, mercados de carbono) consideradas futuristas por muitos, já são algo do presente, algo que já impacta nossas vidas. Você talvez só não entenda isso porque não percebe os efeitos de maneira direta.
Vir para Paris foi não apenas uma decisão estratégica, afinal era a oportunidade me expor a comunidade e ao que há de mais inovador, e também de estar presente fisicamente para conversar sobre oportunidades em minha carreira. Vir para Paris foi também uma decisão de feeling, ligada a minha intuição. Ao receber o convite eu sabia que deveria vir.
Contudo, agora que eu estou aqui, novamente me deparo frente de frente com o dragão. A verdade é que eu não sou uma pessoa tão sociável e conhecer pessoas novas é um desafio para mim. Comparecer a esses eventos com pessoas que eu nunca vi na vida é muito desafiador e explicar que eu estou aqui por interesse pessoal e não representando uma startup é uma tarefa pesada. Essa tarefa herculeana se mostra ainda mais complexa quando feita em um ambiente extremamente masculinizado como o de blockchain e crypto. Minha timidez atinge picos nunca antes vistos em ambientes apenas com homens.
E isso dói.
Me ver de frente com meus limites pessoais me frustra. O que para alguns seria talvez a oportunidade da vida para networking, conhecer pessoas novas e até abrir novas possibilidades para sua carreira, se torna uma potencial porta de ansiedade para alguém como eu.
Não consigo demonstrar a felicidade de ter eventos paralelos com encontros para as mulheres em web3 e de ter ouvido de diferentes bocas os mesmos sentimentos e as mesmas frustrações. Ufa, não estou sozinha. Há outras pessoas introvertidas nesse mar de tecnologia, business e networking-sem-parar de Paris.
Mas, parte de mim se cobra. É preciso falar com pessoas, me colocar no mundo, fazer meu nome brilhar! Mostrar ativamente para diferentes empresas e projetos que pessoas como eu existem (alô interdisciplinaridade) e utilizar isso como catapulta para ser exposta a novas possibilidades na minha carreira. Mas, a outra parte implora. Implora pelos meus pés em um gramado, um por do sol, um livro, um abraço e uma conversa profunda sobre os reais impactos de todas essas tecnologias.
Tentar ser generosa comigo mesmo e com que poderia ser considerado uma fraqueza, me permitir o meu espaço e respeitar os meus limites sociais é doloroso. Eu gostaria de ser mais. Gostaria de poder ser o charme da festa, de falar com todos, de me sentir merecedora de atenção. Gostaria de sentir em minhas veias uma confiança inabalável.
Mas, essa simplesmente não é a verdade.
As vezes me considero uma contradição em pessoa. Se você me colocar em um palco do Ted para falar para mil pessoas sobre um assunto que eu domine, eu faria sem problemas. Se me pedisse para falar de um assunto que eu não domino, eu contaria uma piada e ainda assim, tudo ficaria bem. A verdade é que me comunicar com pessoas não é um problema.
Apesar de a tecnologia e suas possibilidades me animar, não posso negar que o ambiente de blockchain e crypto é ainda um ambiente extremamente competitivo e focado em lucro. Let's get down to business, fechar contratos. E parte de mim quer mais! Quero falar sobre construção do ecossistema, construção de novos modelos econômicos e de mercado, em como utilizar isso tudo para o benefício da humanidade, não sobre como replicar modelos antigos usando novas tecnologias.
Apesar de ter muito mais dúvidas que respostas, eu me permito.
De dar um tempo entre eventos e ir caminhar sozinha observando a cidade. De tentar encontrar o equilíbrio entre sair da minha zona de conforto e me obrigar a estar em ambientes ou situações das quais trazem mais ansiedade que benefício.
Me permito focar nas minhas fortalezas, em como consigo entregar resultados expressivos profissionalmente usando minha parte analítica e de comunicação dentro dos parâmetros corretos. Me permito entender que eu já sou uma profissional completa, competente e capaz, mesmo sentindo tudo que eu sinto. Me permito ser humana.
E me permito sonhar e dividir meu tempo com pessoas que também querem mais para o ecossistema e para a humanidade.
Utópica? Dificilmente. Mas, há sim espaço para mudança. E uma mudança profunda. E as vezes, essa mudança começa com o ato mais rebelde do mundo:
em entender que há muita força em que somos de verdade, não em quem achamos que deveríamos ser.
Eu não preciso ser perfeita.
Eu só preciso ser eu.
Adorei a carta, Ana (como sempre)! Vou voltar para a mentoria 7 e amaria ouvi-la falar de “construção do ecossistema, construção de novos modelos econômicos e de mercado, em como utilizar isso tudo para o benefício da humanidade, não sobre como replicar modelos antigos usando novas tecnologias” em uma de tira dúvidas. Ansiosa!!
engraçado que abri o email pra ler as duas ultimas cartas mas me deparei com duas antigas que ainda não havia lido, essa e a "main caracther".... exatamente o que eu precisava ler. grata um tanto