148 | A história da rosa que não desistiu dela mesmo (ou um follow-up da carta 003)
12 Julho, Dubai 2024
Escrevo essa carta de um dos meus cafés favoritos de Dubai. Sendo sincera, por hoje, ele é o favorito - eu amo como eu me sinto aqui. Do meu lado, um editor de um livro que está corrigindo a mão em árabe algo que me parece um manuscrito. Na minha frente, um homem com seu computador e que tem uma postura admirável. Ele definitivamente parece saber o que ele está fazendo…
A carta de hoje é sobre algo importante. Muito importante. A minha história.
Essa semana tem sido interessante, para dizer o mínimo. Uma série de sincronicidades me levou a encontrar e-mail antigo muito especial e que conta um pouco mais de mim e de quem eu sou. Eu contei sobre ele e toda a sua história na carta 033, que você pode ler aqui.
Ao reler o e-mail e também reler essa carta eu senti um alívio muito grande. Na carta 003 eu comentei que não tinha a menor ideia de onde eu estaria em 2 anos. Mal eu sabia, ao escrever aquilo em Abril de 2022 que já em dezembro eu estaria de mudança para Dubai, com um visto de trabalho dado por mim mesma e morando na minha casa dos sonhos. Mal eu sabia também que eu sairia de 4 turmas pra mentoria para 10 turmas e quase 400 mentorandos no caminho. Mal eu sabia que eu voltaria pra China e tantas outras coisas. Mal eu sabia a mulher que eu ia me tornar cada vez mais.
Desde ontem eu fiquei pensando sobre o quanto eu sinto falta de escrever, de abrir cada vez mais meu coração através das palavras e das tantas histórias que eu tenho pra contar que compõe a minha história pessoal. Acho que me reconectei com esse meu lado - escritora e sensível. Meu aniversário está chegando em breve e cada vez mais a consciência do tempo passando cresce em mim. Não com um medo ou uma sensação de oportunidades perdidas, mas sim de gratidão e de conexão com sonhos profundos - alguns antigos, outros novos.
Ao reler esse e-mail e essa carta, sinto uma felicidade, um certo pulsar. Eu não desisti de mim. Eu não desisti dos meus sonhos. Eu não desisti da luz, não importando o quanto a escuridão pareceu me cercar em tantos momentos.
Olho pra trás e vejo uma história com tantos altos e baixos, tantas felicidades e também tristezas. Um coração que foi partido múltiplas vezes mas que de alguma maneira bate com mais força do que nunca, mas também com uma doçura recém descoberta. Um coração que não anseia mais tanto pelo o futuro e o que virá, mas que se emociona e agradece pelo o que é.
Vejo uma flor, que por muito tempo batalhou para se permitir sair da terra, crescer e que agora começa a desabrochar sua forma única e sua fragrância marcante, mas sútil. Uma flor longe de ser perfeita, com algumas pétalas que já se mostram pequenas marcas, mas uma flor única - que está aprendendo a sentir orgulho do que é, não do que deveria ser.
Olho pra trás e vejo uma história marcada de oportunidades aparentemente perdidas, de uma sucessão de regras invisíveis quebradas e de um distanciamento da multidão. Respiro fundo. Aceito ser diferente e não buscar o que a maioria quer. Respiro fundo mais uma vez. É difícil aceitar que não vou conseguir suprir a expectativa da maioria e que pagarei o preço social por isso.
Não é fácil não ser o que se espera de você. Mas já entendi que é ainda mais difícil não ser quem realmente se é.
Escolho minhas batalhas. Aceito pagar o preço.
Busco internamente pela sabedoria de encontrar o caminho de querer dividir essa história tão humana e imperfeita da busca de caminhos não convencionais dos quais me pertecem e o caminho da dor da exposição e do medo do julgamento externo. Não sou um robô e sinto na pele o medo da não aprovação.
Respiro fundo.
Sinto tudo que há para se sentir. A mistura do bom e do desafiador.
Sinto vibrar no meu peito uma certeza.
A mesma certeza que sempre esteve lá, as vezes latente, as vezes escondida. A certeza de que eu não vou desistir de mim. Dos meus sonhos. De quem eu sou. De expressar tudo que eu sinto. A certeza de que eu não sou perfeita. A certeza que eu sou humana. E que talvez tudo isso que eu sinto é a minha humanidade, tão linda, bela, imperfeita e frágil como uma flor.
Aceito pagar o preço.
Aceito a vida como ela é:
uma rosa. Lutando para desabrochar e dividir com o mundo a sua beleza - imperfeita, única - que mostra de maneira tão natural o que a vida é.
Temporária.
Mutável.
Aparentemente imperfeita, mas com uma fragrância que não deixa dúvidas de que qualquer batalha vale a pena por um único momento da Verdade.
O grande momento da conexão.
Com a Mão que realmente escreve essa história.
E essa Mão…
não comete erros.
Que bom que a rosa não desistiu dela mesma.